sábado, 31 de outubro de 2015

A Coragem da Minha Mãe

Já escrevi aqui sobre o que admiro em minha mãe - por mais odiosa que ela me pareça, de modo geral. Hoje quero me alongar um pouco neste tema.

Há uma indiscutível carga moralista lançada contra aqueles que são pais separados em nossa sociedade. 

Sobre as mulheres, o ranço conservador de sempre - e, deveras, este ainda é o caso em que ocorrem mais ataques devido, principalmente, ao fato de ser o Brasil o maior país cristão do mundo. Muitos abjuram do cristianismo, mas permanecem agindo como os sacerdotes e os crentes pelo resto da vida - seus afetos funcionam, do ponto de vista fisiológico, da mesma forma. Logo, sofremos toda a espécie de ataques, de origens que não se circunscrevem apenas dentre os formalmente crentes.

Contra nós homens, há, igualmente, uma moral mesquinha, ora travestida de feminismo ~pára-que-tá-feio, ora qualquer outra canalhice e indigência intelectual - por mais que, objetivamente, cada relação de pais separados funcione de modo distinto - o que interessa aos achacadores não é compreender cada caso e contribuir para o que deveria ser, em tese, o objetivo de qualquer união: a reprodução da sociedade, representada pelas crianças. Não, nada disso! É importante sempre encontrar culpados e pregá-los em suas respectivas cruzes. "Usemos a imaginação! Não é possível que esses homens e essas mulheres não possam ser culpados de algo!" - assim pensam os que ofendem à natureza, pois, que nos provera de neurônios.

Em qualquer caso, é preciso fazer os separados pagarem por depor contra os dois extremos moralistas e por atentarem contra a sagrada instituição da família. Particularmente, estou convencido de como essa monstruosidade a que se chama de família - contra toda a moral hodierna que quer abrigar a todos nesse conceito carcomido - deve desaparecer da face da Terra, em absoluto (sob uma perspectiva do futuro).
É preciso que a nossa coragem, a dos separados, de afirmar a sua vontade na vida enquanto indivíduos seja - ou que ao menos se tente ser - castrada, atacada, vilipendiada, violada.

Eu nunca tive vocação para carregar cruz. Nunca fui um cristão orgânico - minha vida nunca se reduziu a procurar culpados pelos males do mundo; possuo força e vontade criadora e toda essa ladainha crente me causa asco e contra eles cresce a cada dia a profundidade do meu desprezo. Cada mau agouro que os ventos trazem aos meus olhos e ouvidos - eu faço o esforço necessário para distrair meus sentidos; nem os respondo: deixo que as leis soberanas do universo façam com eles retornem aos seus emitentes na forma de afetos tristes. Pois, essa gente é absolutamente incapaz - fisiologicamente falando - de se afetar de outras formas.

Até encontro motivos para me alegrar com tais situações: contribuí para que gente odiosa possa destilar seu veneno! No entanto, devo alertá-los: a picada da víbora não mata Zaratustra - desperta-o e lembra-lhe ainda ser longa a sua jornada!

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Para As Verdades, Uma Distância Segura

Por que razão os hodiernos se apegam tanto ao dizer olho-no-olho? A bem da verdade, que outra coisa é esse momento senão o pai da mentira?
Aquele apego só se explica por duas vias: incapacidade intelectual ou desonestidade - ambas operam de formas muito semelhantes, deveras.
A verdade precisa de uma distância segura para ser dita - há algo mais incômodo e ofensivo para a maioria das pessoas do que ela mesma? A fúria que inspiraria recomenda a qualquer pessoa que intenta ser honesta a tomar distância
Qual outra razão para o desenvolvimento das tecnologias de comunicação - mormente a internet?! A instituição de uma distância segura para a verdade!
Quem exige o olho-no-olho o faz por puro ardil: sabe ser um dispêndio de energia muito grande dizê-la de fato neste contexto e, em quase todos os casos, a força dessa verdade se quebra no instante seguinte, se perde como um raio que pende de uma nuvem carregada. Um desperdício de verdades cuja carga poderia mover moinhos.
Esta proximidade, este face-a-face, é essencial, no entanto, para que sejam ditas as mais forçadas mentiras - sendo que a mais bela delas é: "eu te amo".

sábado, 24 de outubro de 2015

O Rio Bacalhau


NÃO É O RESULTADO DO ~aquecimento global~..! 

Senão do nosso modelo econômico, da nossa ignorância e estupidez, que mataram o rio Bacalhau!

 Onde eu aprendi a nadar, a pegar cascudo e piaba, a pular da árvore na água, a nadar contra e com a correnteza, a sair do rio quando chove e vem a tromba d'água; onde eu vi mico, cobra, um sapo enorme - preto com mancha amarela, fantástico! -, onde eu aprendi a pular e correr por sobre as pedras, onde eu aprendi a contemplar, respeitar e ser uno com a natureza, enfim...

Pra falar a verdade, eu nem lembro de quando eu aprendi a nadar, de tão cedo que foi! A minha memória afetiva hoje sofre o mais ferino ataque ao saber de tão lastimável fato. Perdoem-me, amigos! Não pude evitar pensar tão alto!

"Quando eu pulava das pedras no rio Bacalhau de água cristalina
E engolia piabinhas vivas pra aprender a nadar, eu já sentia
Que àquela terra eu pertencia..."

domingo, 18 de outubro de 2015

Dia dos Professores

No começo desse ano eu lamuriava sobre minha vida... hoje, mais calmo, mais decantado, posso perceber alguma beleza no acaso do meu destino. Segue-se o que publiquei no facebook no dia dos professores:

Há uns 10 anos, quando no meio do ensino médio, eu já havia decidido o que faria da minha vida produtiva: ser professor. Foi um grande lance de honestidade para comigo mesmo. Não é uma questão de diminuir outras carreiras por proselitismo da minha: cada um que escolha seu caminho de vocação e colha seus frutos.
De minha parte, não posso evitar de falar do imenso orgulho que transborda para além de mim em relação - não ao que se espera da educação pública, dado o seu contexto estrutural e seu papel político na reprodução da sociedade - mas, ao que eu faço nesse contexto e nesse espaço político; ao quanto eu aprendo muito, demasiado além do que ensino; às possibilidades de reconhecimento do espaço da vida e de reconhecer-se no mundo que a educação, num permanente diálogo, proporciona.
O reconhecimento dos meus alunos - mais do que o despeito de quem quer que seja - e a minha autocrítica atestam que aí eu fiz a escolha mais certa para a minha vida até aqui.
Hoje estamos em greve devido ao absoluto descompromisso do governo para com os acordos firmados com a carreira, garantidos em lei - e que é o mínimo para a construção de uma educação melhor em qualquer sentido! Se nem o mínimo nos é garantido, não podemos esperar grandes mudanças nos aspectos mais gerais e estruturais que determinam a forma, conteúdo e função da educação.
Porém, quando me recordo de todos os momentos magníficos que pude experimentar nesses últimos 3 anos, sou arrebatado por um jubiloso anseio de estar em sala de aula novamente, onde eu mesmo me reconheço como um eterno aprendiz, amador, amante da vida. Se algo desse sentimento puder ser ensinado, já cumpri com alguma nobreza o meu papel. Grato, amigos professores e alunos, pela companhia nessa senda!

Estética e Ideologia: Uma Digressão Sobre Mim Mesmo

Ontem à noite assisti ao "O Guia Pervertido da Ideologia", filme de Žižek com direção de Sophie Fiennes.

Ao longo de todo o documentário ele tece comentários sobre a forma, a estética como uma mensagem em si mesma - "pré ideológica" -, apesar do discurso que lhe traduz em ideologia. Citou a 9º sinfonia de Beethoven, que foi e é usada por todo mundo: dos nazistas aos democratas cristãos; dos comunistas aos democratas, em diversos contextos, como "pacote" de sua ideologia.

Outra ideia que me chamou atenção foi à referência ao "Grande Outro", uma instituição que atua sobre a psique de forma autoritária, impositiva, para a qual nós devemos prestar contas, nos justificar, nos confessar, que nos redime ou nos condena, etc. Todavia, ele, como psicanalista, coloca que essa instituição, objetivamente, não existe - somos nós, com nossas necessidades psicológicas, nossas fraquezas, dúvidas, dificuldades em afirmar nossas vontades que a criamos.

Para o Žižek, a grande mensagem do próprio Cristo crucificado foi essa: "Meu Deus, por que me abandonaste?", dentre outras referências ao Livro de Jó e às falas de Jesus. O que o leva, Žižek, a afirmar que apenas através do Cristo é possível criar-se um legítimo ateu - isto é: alguém que afirma a inexistência de uma instituição maior do que nós mesmos, que impere sobre nossas vontades e escolhas. Em contraposição aos "ateus crentes", que negam o mito religioso, mas elegem outros elementos para ocupar o espaço do "Grande Outro": a evolução, a ciência, etc. - ou seja, uma visão 'desistoricizada' da crítica à religião, que não percebe que o mito existiu apenas para cumprir essa função psicológica, etc. O que se aproxima da ideia Nietzscheana de que "Deus está morto e fomos nós que o matamos!", de um deus enquanto um "imperador dos desejos", ser inaceitável na modernidade, etc. Não é novidade pra ninguém que o edifício milenar erigido pela Igreja Católica - e reformado pelos protestantes - guarda a mínima relação com a figura mítica de Jesus Cristo, propriamente. Inclusive, eu, que nunca tive uma educação religiosa formal, só pude ter alguma simpatia pela figura de Jesus, o Cristo, a partir das considerações duais de Nietzsche ("o mais nobre dos Judeus", em algum lugar do "Humano, Demasiado Humano", 1877). Mas não é sobre isso que quero falar aqui.

Há uma belíssima passagem do "Gaia Ciência" (1882): "Que são essas igrejas senão túmulos e monumentos fúnebres de deus?" Isso vai dialogar com a minha digressão a partir daqui.

Como vocês já devem saber, eu sou um artista muito antes de ser professor - e talvez até por isso eu exerça essa que é uma profissão cênica, fundamentalmente. Ao longo de 2013, minhas experiências pessoais foram projetadas para além de mim numa porção de músicas que juntei no álbum abaixo. É um conjunto de 10 canções carregadas de teclados sombrios; de canto sussurrado; um ou outro momento de gritos e de guitarras distorcidas; de cores escuras escolhidas para a arte do álbum; e - vejam só! - uma referência à canção "Infância na Cidade de Goiás" na foto da Igreja Matriz da cidade, que a gente havia tirado em uma das últimas viagens para lá.

Pois bem: este é o "invólucro" estético da minha mensagem, que não vem ao caso aqui. Como compositor amador - quero dizer: objetivamente, alguém que não domina conscientemente a psicoacústica, não possui estudo formal de composição, etc. -, essas escolhas estéticas são feitas inconscientemente. Eu estava consciente de que passava por uma depressão profunda, mas esses elementos não ficavam claros na hora de compor. O que quero dizer é: eu estava imerso na minha ideologia - tateando as paredes de um quarto escuro.

Refletindo sobre as colocações do Zizek, eu tive um insight luminoso, que me aterrorizou madrugada a dentro: nesse álbum eu estava realizando um funeral do meu "Grande Outro". Todos os elementos estéticos apontam para isso: a escuridão, a sobriedade, os teclados monocórdicos, as dissonâncias, os gritos de horror pela morte de um ente tão querido - a primeira faixa eu intitulei "Boa Morte"! Eu estava lamentando a percepção do meu inconsciente de que ele é, fundamentalmente "órfão e ateu" (li isso em alguma postagem do Bruno Cava, acho que sobre o curso do Anti-Édipo).

Há um outro aforismo interessantíssimo do "Opiniões e Sentenças Diversas" (1878) em que Nietzsche - que percebia a ideologia da forma estética, isso se vê em cada aforismo seu de crítica artística - comenta do uso póstumo da obra de Beethoven:
"A execução realmente "histórica" falaria de modo espectral para espectros. - Honramos os grandes artistas do passado não mediante o estéril receio que deixa cada palavra, cada nota exatamente como foram colocadas, mas por ativos esforços em ajudá-los a repetidamente voltar à vida. - É certo que, se imaginarmos Beethoven retornando subitamente e presenciando uma de suas obras na mais moderna forma de animação e refinamento nervoso, que contribui para a fama de nossos mestres de execução, ele provavelmente ficaria mudo por um bom tempo, hesitando se deveria erguer a mão para amaldiçoar ou para bendizer, mas talvez falasse, por fim: "Bem, isto não sou eu nem deixa de ser eu, é uma terceira coisa - também me parece algo certo, embora não o certo. Mas atentem vocês para o que fazer, já que vocês é que têm de ouvi-lo - e quem está vivo tem razão, como diz nosso Schiller. Então tenham razão e me deixem voltar para baixo". (Aforismo 126, "Arte do Passado e Alma do Presente")

Com o "Aeternum Phoenix", eu lancei um pacote ideológico em que lamentava a morte dos meus ditadores internos: o que só pode ser louvável se tomarmos um caminho de celebração por essa morte. Foi o que fiz no próprio álbum de 2013, no vigésimo minuto de "Phoenix Flight": "Cantei as canções que quis, lancei-me assim aos céus/Nas alturas fui feliz rasgando todo véu"; e em 2014 com o "Além de Mim", a minha mais elevada forma de júbilo na percepção dessa liberdade de espírito. No começo desse ano fiz o Iñaron, que tem um sentimento um tanto diverso do anterior; é muito recente, não me sinto em condições ainda de refletir sobre ele, mas é, sem dúvida, um ponto de desenvolvimento geral da minha estética.

Como o
Žižek deixa claro no início do filme, libertar-se da ideologia dói, fere. Quem se apavorar diante dessa dor apegar-se-á à ideologia violentamente até o último espasmo dos nervos! De onde vem a força terrível para assassinar o monstro mentiroso que sustenta nossa ideologia e superar-se a si mesmo, afirmando a própria vontade? Como artista solitário e orgulhoso que sou, devo guardar meus segredos para a posteridade. Mas deixo uma dica: leiam o Zaratustra!

PS.:
A quem interessar possa - a trilogia dos álbuns de 2013/14/15:

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Zelar Pela Abundância Sem Errar Pelo Excesso

Demorei quatro noites para digerir a refeição pesada em que me foram servidos meus afetos tristes, meus desejos incontidos, minhas frustrações; a mim mesmo, enfim.
Lembrei-me de um aforismo de "Aurora": tudo que é bom surge com má-consciência, pois é novo, ataca a tradição e por ela é atacado com ferocidade.
Pois bem: pendurei por sobre minha cabeça a minha própria lei; viver conforme a minha própria vontade, depurando-a.
Foram quatro noites em que minha autoestima duelava com minha autocrítica nas alturas - onde estão sempre, em camadas da atmosfera em que o oxigênio torna-se rarefeito. É bem difícil pensar muito na falta de ar: bem o sabem os que estão se afogando; dependurados na encosta de uma altíssima montanha; em uma aeronave despressurizadas; é preciso a sorte de ter a ideia certa o mais próximo possível de sua consciência e a força necessária para agarra-la.
Ambas, minha autoestima e minha autocrítica, possuem bastante fôlego.
Hoje tenho uma tarde leve; pois já carreguei umas tantas bem pesadas nas costas. Vou embora desse paraíso de volta pra minha nova casa, em cuja porta vou pendurar a insígnia dessa nova fase de minha vida: zelar pela abundância sem errar pelo excesso; ser muito e a cada dia mais; e ter somente aquilo que eu preciso, o que não é muito.

domingo, 11 de outubro de 2015

Para Uma Cura da Vontade


Vi uma imagem ainda há pouco que me causou um estranhamento profundo... De repente, me aterrorizava a questão: como pude elaborar durante tantos anos um tão terrível contorcionismo da vontade; envenenar e enturvar todas as fontes de onde brotam as minhas paixões? Talvez demore ainda muitos anos pra recuperar da atrofia a musculatura do meu desejo. 
Essa consciência meio ruim é mesmo um sinal de que preciso medir - mensurar, pra ser mais preciso - de novo todos os afetos que experimento. Dialogar com uma multidão em silêncio, romper o mais desolado deserto. Mergulhar profundamente em mim mesmo, ainda mais. 
Ainda hoje fui à praia do amor, onde o mar me oferece alguma resistência. Na falta de aparelhos de ginástica, quebrar ondas é um bom exercício de equilíbrio, de tônus abdominal, de fôlego. Ainda quero tentar exercitar minhas asas de chumbo, fazê-las me levar alto num vôo seguro. Todavia, não tenho tido oportunidades: minha vaidade tem se tornado a cada dia mais caprichosa; nem anseia mais se mostrar tanto! Os hodiernos me constrangem; meu orgulho, meu asseio, me impedem de dar um passo à frente. Sugestão? Dormir muito! 

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Apetite

Que visão intranquila do paraíso! Que cena tragicômica: o demente vôo deste pássaro com asas plúmbeas! Permanecesse no solo qual pavão, que exibe tranquilamente suas virtudes sem precisar mostrar-se naquilo que não sabe fazer! Porém, aquilo que tenho demais humano, a minha vaidade, me compele a alçar vôos. Me ataca o orgulho: viver tendo asas e não as usar. Como todo exercício, a prática determina o domínio da fortuna, o horizonte de possibilidades de sucesso e fracasso. Melhor sorte na próxima!

Pois bem: farejamo-nos, permitimos que o nosso aroma fosse degustado, porém, não nos deleitamos no nosso banquete. Talvez a sua imperturbada aparência me fosse por demais suave: eu, quem gosto de comida apimentada; ou ainda parecido doce, num momento da vida em que meu paladar, mais do que ter se acostumado, pede pelo amargo. Talvez o meu furioso apetite lhe tenha sido percebido como ofensivo: não me permitiria saborear com a devida medida o seu enternecido sabor. O que devo dizer, não sem profundo pesar, ser uma dolorosa calúnia contra os meus sentidos. Talvez o cheiro de sangue parecesse-lhe por demais asqueroso, terrível, talvez fosse até vegetariana... - eu, que carrego navalhas pra cortar minha própria carne e ofertá-lá crua, temperada com ervas ressequidas. Como abrir o apetite de quem tem aversão ao cheiro de sangue?

Aquelas pessoas com quem convivo em Brasília - que me perdoem a honestidade - me causam nojo. O seu gosto de isopor, de comida congelada, conservada para muito além do prazo que a natureza daria a qualquer alimento saudável, me enoja. Os concurseiros, vergados ao falacioso único caminho possível, analfabetos para qualquer coisa além dos editais; pior: os concursados, como cadáveres conservados em formol, desfilando como múmias ansiando por vida eterna: como me nutrir de gente dessa espécie? Não sou um inseto: eles que reviram o lixo e de qualquer resto podre fazem seu alimento!

Não quero ser confundido com outra coisa que não um leão, uma serpente ou uma ave de rapina: uma soberana confiança de si, um profundo desprezo por aquilo que não lhe serve de alimento, uma espreita e um bote certeiro, um ritual que enobrece a sua refeição.

Foi isso a vida? Ótimo, mais outras várias vezes!

domingo, 4 de outubro de 2015

Questões Latentes Para Uma Hipergeografia

Nietzsche faz digressão convergente no "Humano, Demasiado Humano": para ele, enquanto persistir a força do mito religioso persistirá o mito que fundamenta o Estado enquanto forma de organização de determinado recorte do espaço; que legitima a castração, perseguição e neutralização daquilo que diverge do interesse da "sociedade" - um pacto entre "sócios" (eu não assinei nenhum contrato. E vocês?), etc, etc.

Não à toa ele dedica o livro aos "espíritos livres" e em homenagem a Voltaire, encampando a batalha ao lado dos iluministas.

Dialogando com a citação do Krishnamurti, o que é um "governo" - o Estado, melhor dizendo - senão uma hiper-empresa? Um corpo que superpõe outros corpos e organismos. Ou, porque uma empresa ou família ou qualquer espécie de organização social brasileira é diferente de uma chinesa?

Mais ainda: que espécie de organização do espaço determina um organismo transnacional - que opera com seus órgãos por sobre Estados-nacionais, nos seus interstícios? Como as corporações - e a ideologia corporativa - pode reproduzir-se nos mais diversos contextos geográficos?

Chamemos esse expediente de "imperialismo" por inquietude e falta de imaginação; por embasbacados que estamos dada a complexidade de tal arranjo de poder nos espaços. Todavia, é isso o que queremos fazer com os nossos corpos - adaptarmo-nos ao projeto político das corporações? Responder à pressão com nossos afetos negativos, regalando-nos na nossa impotência?