segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Futuro, Adeus!

Há talvez cinco anos, desde que abri o blog, portanto, venho prometendo a mim mesmo a publicação de forma independente, autônoma, de um álbum completo meu. Sinto que não poderia ser um melhor que este. A qualidade técnica das gravações esta para o nível do som dos anos 70/80, sem dúvida, o melhor que eu poderia fazer gravando no meu próprio quarto com o equipamento amador que tenho. 
Desde o final do ano passado venho trabalhando em um "pacote" de 30 músicas. Algumas dessas canções já haviam sido publicadas por mim aqui de forma isolada ("Brasil, Nunca Mais" que, inclusive, chegou a tocar no programa "Nunca en Domingo" da rádio Universal do Uruguay; e "Senhor de Engenho no Senado" em versão ligeiramente diferente). Porém, aqui encontram-se amparadas pela textura do conceito. Desse pacote, esta é a primeira parte e a que publico pela primeira vez aqui neste blog: 

"Concreto Armado - Futuro, Adeus!"
(64:45) 
"O mundo é mesmo de cimento armado"
C.D.A.
"Privilégio do Mar",
Sentimento do Mundo, 1940.
1. O Futuro Adeus
2. Tudo Em Seu Lugar
3. Nove de Hydra
4. Quando Os Impérios Têm Febre
5. A Paz É Difícil
6. Sapo Barbudo
7. BRock[er]
8. Predador
9. Razão Comunicativa
10. Amor Livre
11. Senhor de Engenho no Senado
12. Socialismo Moreno
13. Brasil, Nunca Mais
14. Proibidas Radiodifusão e Execução Pública
15. Venturis Ventis

As canções deste trabalho dialogam com o ano de 2011, o qual muitos teóricos compararam com o ano de 1848, o ano das revoluções. Foi da assembleia da ONU daquele ano de onde extrai o audio do presidente Obama presente em "A Paz é Difícil". Porque, de fato, a paz é difícil e não se faz com discurso. Muito menos com a ocupação criminosa do território palestino por parte de Israel, amparada pelos EUA. Outra referência, sem dúvida, é a nova onda de histeria relativa ao Calendário Maia, às Teorias da Conspiração, etc. Para estas correntes de pensamento, de tão ridicularizadas, guardo alguma simpatia, considerando algum tempo para leituras alternativas da realidade sempre que posso.
Muito deste trabalho rebusca também alguns valores de certo esquecidos pela marcha do progresso à todo crédito: A desconstrução do mito religioso que aliena; do mito democrático que fascina; do mito lulista que paralisa a crítica da condição nacional; do mito leninista que centraliza o poder; do mito do amor como propriedade; e tantos outros. Este trabalho pode até ser considerado um manifesto isolado, unitário, inócuo. Assim o prefiro a participar das mais diversas formas da coletiva insanidade. Porém, não acredito que o seja. Gosto de pensar que faço parte de uma corrente que talvez ainda esteja um tanto difusa, mas que encontra amparo, por exemplo, nos dois últimos álbuns do Killing Joke (2010, 2012). 
É, sem dúvida, a manifestação da vontade de dizer adeus a um futuro de controle, de ausência de qualquer rastro de dignidade ou ainda um futuro de conformismo. Como dizia o velho Darcy, nessa vida só há duas opções: se resignar ou se indignar. E eu, de minha parte, como demonstro nesse pouco mais de uma hora de música, também não vou me resignar jamais. 

Juliano,
03/12/2012.

Ficha Técnica:

Da Crise da Música à Música da Crise.

"Concreto Armado" é o nome-fantasia para todas as letras, todas as músicas, vozes,
teclados, guitarras, baixo, violão, bateria, edições e efeitos de áudio:
Juliano Berquó.
Fotos do Encarte: Sérgio Berquó, 2010/2011.
Gravado entre julho e setembro de 2012.
- Inserção de áudio em "A Paz é difícil":
"The fact is peace is hard", Barack Obama em discurso na Assembléia Geral da ONU, 2011. 
- "Cidades de Patrão": Expressão utilizada por alguns jovens das periferias de Brasília
para se referirem aos bairros (que no Distrito Federal são também chamados de cidades)
das classes médias e altas. É como a segregação socioespacial salta aos seus olhos.

Todas as baterias e teclados deste trabalho foram realizados por meio do Piano Eletrônico 2.5, software livre.
É encorajada a reprodução deste trabalho para quaisquer fins desde que de caráter não-lucrativo.

CONTATOS: 
Tel. Cel.: (61) 8515-6753
Email 1: julianoberko@gmail.com
Email 2: julianoberquo@live.com

Aceito convites para fazer festas de criança, bodas de prata da tia-avó, e outras do gênero. Garanto meu show com meus instrumentos, bases pré-gravadas e meu equipamento. Além das minhas músicas, é claro.

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Brasil, Nunca Mais

Recentemente, faleceu a senhora Maria Rosa Monteiro, mãe do icônico Honestino Guimarães, este estudante de Geologia da UnB que a nossa ditadura civil-militar mandou pra algum lugar desconhecido... A luta de sua mãe pela verdade sobre o filho tornou-se simbolo de toda a luta pela publicação dos arquivos e punição aos torturadores do período militar.

(Em tempo, devo dizer que o STF que julga o mensalão pra "proteger a república" e a constituição, guardando óbvia coerência,  não o fez assim quando julgou improcedente a ação da OAB contra a a Lei da Anistia de 1979. 1979!)

Até algum tempo atrás eu pouco (quase nada) sabia sobre este cidadão, Honestino. Pesquisando, descobri que ele era de Itaberaí, Goiás (partindo de Goiânia, última cidade antes de chegar em "Goiás", a cidade origem da minha família, pela qual eu sempre passava...), que sua família era de advogados e que, talvez, até o seu pai tenha conhecido meu bisavô, Urbano, também advogado (isso minha mãe supôs, dentre as suas memórias, pelo sobrenome da família Monteiro).

Quando me dei conta do quão próximo um líder estudantil assassinado pela ditadura estava de mim, do quanto de nossas vidas pode ter sido em algo similar, seja pela Serra Dourada ou pela Universidade de Brasília, compreendi e fiz parte de toda esta luta pelo resgate de nossa memória coletiva. Da memória dos que luta(ra)m e sonha(ra)m.

Neste instante, surgiu-me como epifânia a ideia de compor uma canção de homenagem, de protesto, que seja, sobre esta história... Lembrei-me daquele livrinho clássico, "Brasil, Nunca Mais" e da sua significância neste contexto. Percebi que poderia usar o jogo de palavras com o nome do "álbum" que eu estava compondo, "Futuro, Adeus!". Ora, quem diz adeus ao futuro só pode ser, justamente, aquele que ficou no passado. Assim, esta canção, quase como uma psicografia, põe na primeira pessoa a voz daqueles tantos que tombaram pelo sonho da democracia, da justiça e da igualdade...

Deles, florescemos nós que, presentemente, lutamos cotidianamente pelo alargamento dos espaços de felicidade nesta vida...
E podemos lutar com algum conforto à custa da tortura e execução de muitos no passado.
E lutamos sob alguma hipocrisia, sobre os ombros largos de tantos escravizados, desterrados e massacrados povos do presente, no Brasil e no mundo.

De todo modo, lutamos como podemos. Mantemos acesa a chama do sonho.

"E se não achar meu caminho
basta-me crer procurá-lo de coração."
Honestino Monteiro Guimarães
(1947-1973?)

"Brasil, Nunca Mais"
(Letra e Música: Juliano Berquó)

Avise minha mãe,
Avise minha filha e toda minha família
Diga que eu não perdi a fé
E que apesar das circunstâncias
Eu morri de pé.

Avise a minha querida
Que a minha vida não foi em vão
Que valeu a pena
Avise minha pequena.

Avise aos jovens nas salas de aula
Que não tivemos escolha
Que não nos deixaram nada
Que pensar nos condenava

Por fim, eu peço
Que avisem aos nossos inimigos
Que nós continuamos vivos
Mais que nunca nas lutas

O meu pelos seus
Futuro, adeus...
Mas não se esqueçam de nós
Céu vermelho-anil
Brasil, nunca mais...
E vivam em paz.

In Memoriam: Maria Rosa Monteiro.

Mitomania

Há tanto tempo sem postar que eu já nem sei como fazer nessa nova interface do blogger...
Até eles estão contra mim!
Publico hoje esta canção cuja letra está ulteriormente exposta. Muita coisa aconteceu desde minha última postagem...
Durante a última greve dos professores da UnB eu terminei o projeto da minha banda de um homem só, Concreto Armado (lá se vão oito anos...), "Futuro, Adeus!" ("Brasil, Nunca Mais" e "Senhor de Engenho no Senado" fazem parte deste trabalho).

Em setembro, com a retomada dos trabalhos na UnB, estive recluso para a finalização da minha monografia. Formado, logo retomei os trabalhos com as minhas composições, finalizando outro projeto no qual estava trabalhando há quase um ano, "Indizível". 
Mas eu não vou ficar falando disso muito não. Com o tempo, pretendo promover e publicar para download todas estas músicas por aqui. 
Por enquanto, fica aí e curte o som dessa que faz parte do "Indizível" que é o melhor que eu posso fazer.

"Mitomania"

Desde quando nasci nunca vi a luz do sol
Flanei por instinto depois de cair no chão
Assim, quando nasci não fui parido de cordão
Me alimentara no tubo de tudo do canal
Nunca tive fome de não saber quê comer
Aprendi a ter vontade de ter quando vi TV
Nas tantas vezes em que morri desde quando nasci
Depois de crescer, eu aprendi a mentir

Aonde levam estas dores que afloram do afeto?
Onde reside minha razão, mãe do meu direito?
Que posso fazer para corrigir o meu defeito?
Agora que o gene do mal já está desperto?

O que vi ao longe e que parecia miragem
De repente, veio a mim ou fui a ele, que é verdade?
Cortara minha garganta enquanto a guerra inflamava
A música havia, mas eu não pegara em armas
Então, fugi do campo de batalha
Quando o sol estava baixo, saí sem dizer nada
Expunha minhas entranhas que, alimentadas de anseio,
Perdido o esteio, abandonava-as no convés

Quando quis o que quis, soube o que era a morte
Que cortava o couro e desfiava véu profundo
Onde estava o norte, velho e forte, nunca soube
De tudo que é escrita, só quero o que me cabe
O resto não resumo, sem posse nem repouso
Por dentro, ouso o sentido de pertencimento
Da bolsa que obriga saber como lhe partir
Depois de crescer, aprendi a resistir

Que faço com este canto que tanto pesa no peito?
Com estes versos afoitos que brotam quando escrevo?
Que faço com esta chama que tanto me queima?
Será que o fogo que consome ainda me anima?

Meu melhor ataque foi minha defesa
Quando o sol estava alto, quis sombra e água fresca
A porta que se abria de passagem foi à tinta
De todo minério, quem nunca viu metais?
Cantais todo mantra que se eleva com o fogo
De onde tudo emana, o céu mais que azul
Fui cantar meu sotaque, qualquer coisa ainda tento
Pro tempo que fulmina, tenho papel e caneta

A vertigem sonora que dobrava minha unha
Era tudo que eu queria quando o sol se punha
Essa febre constante que não me mata a sede
Que não me mata o sonho, não sei por que componho
Desta rosa que tanto pesa, feito pluma de chumbo
Não me reste platitude metamórfica de flor
Fui rasgar meus contratos, qualquer canto mais distenso
Talvez ainda pense no tempo mais que perfeito

Só quem sabe como é triste cantar sozinho
Sabe o quão profundo que lhe atinge o espinho
Só quem sabe ver o louco e ouvir seu uivo
Pode saber o que nele ainda há de vivo
Na madrugada fria, quando estiveres na cama
Lembre dele na praça com uns trapos de coberta
Se no manuseio do que corta, um descuido
Encontre teu reflexo na sua ferida aberta

Ficha: 
Bateria e teclados - Piano Eletrônico 4.3
Gravado com Audacity.
Voz: Juliano Berquó, com alguma desafinação residual. 



Que minha presença no mundo incomode tanta gente quanto for possível;
Que minhas opiniões sejam sempre incompreendidas e combatidas por todos;  
Que eu perca tudo em absoluto, menos esse meu bom humor invejável..! 
Antes que eu morra.



sexta-feira, 30 de março de 2012

Senhor de Engenho no Senado

N'outros tempos, a escravidão era uma coisa legal, dava status ao Senhor dono de quantos mais escravos fosse possível. No Brasil, ainda imperava o latifúndio monocultor de exportação de Cana-de-Açúcar, o sistema de Plantation, semelhante ao do sul dos EUA.

Os tempos mudaram e a escravidão foi posta na ilegalidade pela Princesa (vejam bem, PRINCESA... capaz que se fosse Presidenta, o escravocrata seria da base aliLinkada... ih!!!) Isabel. O Código Penal Brasileiro de 1940, na redação atualizada em 2003 do seu Artigo 149, tipifica a "Condição Análoga à de Escravo". Hoje no Brasil impera o latifúndio monocultor de exportação de Soja (e um tantinho menos de cana-de-açucar) mas ninguém chama mais de Plantation. Agora é "agronegócio" o nome do boi.

O caso é que nesta República faceira acontecem coisas...
Acontece que aquele bico de papagaio abandonado por Goyaz que obteve autonomia, um desejo antigo das elites locais, em 1989, o Tocantis, nos elege um representante acusado de se utilizar de trabalho escravo nas suas fazendas no sul do Pará.

É a 6ª economia do mundo. Que escraviza no campo pra mandar Soja pra China (e outras metrópoles) que, por sua vez, escraviza nas cidades e grandes complexos industriais para exportar pra gente de volta um monte de parafernália tecnológica cheia de obsolescências e bens manufaturados diversos. Como se vê, modelo de economia sustentável pro futuro da humanidade. É a 6ª economia do mundo que, como gosta de pontuar sempre o Senador Cristovam Buarque, não quer pagar 1.420 R$ como piso nacional para os professores de suas crianças.

Sem mais, faça-se a música.



"Senhor de Engenho no Senado"
(J. Berquó)

- Somos todos escravos -
É o que diz a impressão
Exaustiva jornada de trabalho
E restrição da locomoção
É o que diz a legislação
Então, há algo errado
Tem Senhor de Engenho no Senado.

Vivemos em Estado Democrático
É o que diz a Constituição
Pra ser eleito, basta ter pasto
Pro curral eleitoral
É o que diz a eleição
Não é possível, está tudo errado
Tem Senhor de Engenho no Senado.
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É uma letra simples com música simples, baseada em 2 ou 3 linhas de cordas, mas que eu não poderia deixar de compartilhar como forma de compartilhar um pouco de minha indignação.

Enquanto isso, está parada no Congresso a PEC 438/2001, a PEC do Trabalho Escravo, que garante que as terras onde forem encontradas condições análogas à escravidão sejam imediatamente destinadas à Reforma Agrária. Num Congresso cheio de "Ruralistas" e partidos desinteressados por encampar a Reforma Agrária, apenas a pressão de movimentos sociais organizados, apoiada em mídias alternativas, pode garantir algum avanço no sentido de humanizar o campo brasileiro.